terça-feira, 12 de junho de 2012

Shame

"Shame" (2011) dirigido por Steve McQueen (Fome - 2008) é ousado e explícito. Sobre os lençóis que envolvem o protagonista totalmente nu logo no início, já percebe-se o diferencial deste longa, mas ao desenrolar da trama, vemos e sentimos muito sobre o angustiado Brandon (Michael Fassbender), que está muito além do que é dito ou exposto em cena, dando espaço para interpretações múltiplas para as causas e os efeitos de sua compulsão sexual. Brandon é um sujeito bem-sucedido, boa pinta e sozinho por opção. Tal escolha já seria bem delineada e justificável por seu estilo de vida: um inveterado sexual em todos os aspectos, ao ponto de alimentar seu vício mesmo em ambiente de trabalho. A chegada de sua irresponsável irmã, Sissy (Carey Mulligan) só acentua a já notável patologia dele, já que este também demonstra extrema dificuldade de envolvimento emocional com todos a sua volta, e a impossibilidade de definirmos o que veio antes, a doença ou a introspecção de Brandon, é um dos pontos mais intrigantes desse interessante roteiro.
Impressionante como o protagonista de "Shame" não tem apego por nada. Ele vai para o trabalho, mas não gosta do que faz, ou não se interessa o suficiente pela profissão. Não tem relacionamentos verdadeiros, e sai com o chefe David somente porque este vê em Brandon a isca perfeita para despertar o interesse das mulheres. "Shame" segue em bom ritmo e não demora muito para a personagem Sissy invadir a rotina de Brandon. E ela desestabiliza aquela rotina segura e previsível dele que parece se resumir a chegar no trabalho atrasado, sair com o chefe para "caçar" e terminar a noite sempre com uma mulher diferente. Sissy é um risco para essa segurança vazia de Brandon. Ela grita, e de forma insistente por atenção e carinho, tentando resgatar laços e manter uma relação. Tudo que ele parece incapaz de conseguir. É notável que todo o problema de Brandon em se isolar venha de um trauma familiar.
Não há economia nas cenas de masturbação, destacadamente mecânicas e nada sensuais. Os personagens são pessoas cheias de angústias, Brandon é frio, vazio e nada supre suas necessidades, chegando a exaustão de tanto fazer sexo. Quando as coisas vão para um lado mais sério, por exemplo, quando sai com uma colega de trabalho para jantar, e quando o mínimo de carinho surge, já o faz se afastar. O desconforto aparece de modo sutil e com ele vem um sorriso aliviado ao final deste malsucedido encontro. Já Sissy busca atenção e carinho no irmão, tudo o que ele não quer e não consegue compartilhar. Uma cena linda destaca toda a ausência de afeto na vida de Sissy, quando canta "New York, New York", numa versão que transborda melancolia em sua voz.

Em nenhum momento o sexo é ligado ao prazer, mas sim a dor. Brandon realiza todas as suas fantasias sexuais, porém não há um segundo de alegria em seu rosto. Ele é um ser humano perdido em suas mágoas passadas, seja lá quais foram, e ele descarrega tudo no sexo. O filme tem uma cadência lenta, mas consegue com maestria deixar a narrativa atraente do começo ao fim, fazendo de sua câmera quase como um objeto cênico em boa parte do longa, mudando somente nos momentos de tensão causadas pela angústia perante a necessidade do sexo.
Os diálogos são secos e diretos, deixando bem explícito que toda a atual situação dos irmãos é fruto de um passado não muito bom, além de mostrar de forma contundente como é viver em uma condição de dependência sexual. Impossível não sentir pena diante de um homem fragilizado pela sua compulsão, e principalmente pelas consequências que traz. Michael Fassbender construiu um personagem refinado e de hábitos polidos, mas que só encontra no sexo o verdadeiro conforto para sua solidão existencial. Não é agradável acompanhar a sua autodestruição.

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